Um poeta e um poema por dia - XIX
Hoje, Vasco da Graça Moura
"insinceridadequis-nos aos dois enlaçados
meu amor ao lusco-fusco
mas sem saber o que busco:
há poentes desolados
e o vento às vezes é brusco
nem o cheiro a maresia
a rebate nas marés
na costa de lés a lés
mais tempo nos duraria
do que a espuma a nossos pés
a vida no sol-poente
fica assim num triste enleio
entre melindre e receio
de que a sombra se acrescente
e nós perdidos no meio
sem perdão e sem disfarce,
sem deixar uma pegada
por sobre a areia molhada,
a ver o dia apagar-se
e a noite feita de nada
por isso afinal não quero
ir contigo ao lusco-fusco,
meu amor, nem é sincero
fingir eu que assim te espero,
sem saber bem o que busco."
Vasco Graça Moura, in "Antologia dos Sessenta Anos"
Este poema deixou-me dividida e numa amálgama de sentimentos contraditórios, António!
ResponderEliminarFico contente que, com este poema, mais uma homenagem seja feita a V.G.M., que tem recebido o reconhecimento por parte das nossas entidades governamentais, ainda em vida! As homenagens a título póstumo, fazem-me lembrar aquele fado de Coimbra, "Rosas Brancas"...sabe qual é?
Por outro lado, quando acabei de ler o poema, senti vontade de chorar!
Não me pergunte porquê!
(...)
Não me conheço ao espelho:
Serei eu? Não serei eu?
Já deixou de ser vermelho
Um coração que bateu.
E assim me despedaço,
Sem salvação nem socorro:
Se não sou eu, me desgraço
Se sou eu, sinto que morro.
O final de "Os nossos tristes assuntos".
Porque liguei um poema ao outro, para além de serem ambos do mesmo autor...não sei!
Amanhã ainda voltarei para o 'trereler':)
(gosto de inventar palavras)
Vantagem dos não-eruditos!
Um beijo e uma noite serena.
Janita
Janita, Gostei muito do seu comentário. Este poema também me causa perplexidade... Mas, claro, como a Janita também escreveu, há vantagem em não sermos eruditos. De uma maneira geral a poesia de VGM deixa-me sempre 'atrapalhdo'. Estou a lembrar-me de "Fanny", por exemplo.
ResponderEliminarGostei, também de sua palavra deveras erudita: "trereler". Uma noite linda e tranquila. Um beijo e um excerto do "soneto do amor e da morte":
"tivesse de acabar, sempre a doer,
sempre a doer de tanta perfeição
que ao deixar de bater-me o coração
fique por nós o teu inda a bater,
quando eu morrer segura a minha mão."